Gestão Híbrida de Projetos: a arte do equilíbrio
A gestão de projetos tem se tornado cada vez mais frequente e demandada nas organizações. Apesar de parecer ser uma disciplina recente da administração de empresas, os fundamentos da gestão de projetos remontam ao século XX, quando Frederick Taylor (1856–1915) iniciou seus estudos da administração científica e Henry Gantt (1861 – 1919) realizou seus estudos sobre a ordem das atividades no trabalho. Desde então os grandes projetos de engenharia demandaram a implementação de novas metodologias e técnicas para garantir que o escopo contratado seja entregue sempre dentro do prazo e custos estipulados. De forma complementar, métodos de marketing, psicologia industrial e relações humanas começaram a despontar como partes integrantes do gerenciamento de projetos nas últimas décadas.
O método é meio, não é fim.
Embora vários modelos comerciais tenham evoluído durante esse período, todos compartilham uma estrutura básica comum: um gerente administra o projeto, reúne uma equipe e assegura a integração e a comunicação do fluxo de trabalho horizontalmente em vários departamentos diferentes. Em cima destas bases comuns, nos últimos dez anos, o gerenciamento de projetos continuou evoluindo e duas tendências destacaram-se:
Metodologias Ágeis: Nascida no mundo da tecnologia da informação, essa tendência enfatiza projetos mais simples, ciclos de projeto mais curtos, colaboração eficiente entre os membros da equipe, participação mais sólida dos membros da equipe e tomada de decisões. Essa tendência é amplamente conhecida como gerenciamento de projeto ágil e inclui algumas metodologias relacionadas, como Scrum, Cristal, Kanban, Programação Extrema, Processo Unificado e muitas outras.
Metodologia PMI: Considerada como a tendência mais tradicional, se baseia em cinco pilares, que são seus processos: iniciação, planejamento, execução, controle e encerramento. Tem ênfase na forma estruturada de trabalho, organizando com clareza a interação da gestão de projetos com a funções departamentais das empresas. Pode-se dizer que é o resultado de vários anos de evolução da gestão de projetos, organizando-se como um compêndio de boas práticas, formalizado por uma instituição chamada Project Management Institute (PMI).
Existe atualmente uma discussão sobre qual das tendências é a melhor ou correta. Estimulada principalmente pelos praticantes da gestão de projetos da área de TI, essa discussão se baseia nas seguintes premissas para existir: os métodos ágeis são menos burocráticos, são flexíveis e focados nos clientes e a metodologia PMI aplica-se apenas a projetos muito grandes que não aceitem mudanças de curso, ou seja, é tida como rígida e burocrática.
Na verdade, não existe certo ou errado, melhor ou pior. Existe aplicável ou não. À aplicação equilibrada das ferramentas e metodologias dessas duas tendências se dá o nome de gestão híbrida ou metodologia híbrida. A aplicabilidade de cada uma dessas tendências e suas respectivas metodologias dependem diretamente de alguns fatores, discutidos a seguir.
O ramo de atuação da empresa
Existem ramos de atuação que beneficiam a utilização de metodologias ágeis. As empresas que trabalham com a prestação de serviços (ex.: tecnologia da Informação ou consultorias) em geral podem se dar ao direito de reduzir o nível de planejamento e buscar maior agilidade na execução. Isto está diretamente ligado com a ausência de produto físico que demande alto nível de investimentos em ativos (há exceções, por exemplo, ramo hoteleiro). O produto intangível desta empresas está diretamente ligado ao produto entregue pelo projeto, ou seja, a remuneração se dá através da venda do “deliverable” de um projeto. Isso aumenta a possibilidade de dar foco exclusivo na interação com o cliente, reduzindo a perda de tempo com procedimentos internos da empresa, que demandem maiores planejamentos.
Os ramos da economia que demandam investimentos em linhas de produção, prédios, ferramentais, dispositivos e ferramentas possuem processos claros e específicos para avaliar a viabilidade destes investimentos e por sua vez o planejamento da implementação destes ativos. A redução da fase planejamento, pode levar a liberação de desencaixe financeiro em momento de pouca maturação de um produto e por sua vez acarretar em prejuízos relacionados a retrabalho de ativos ou aditivos contratuais junto aos fornecedores destes.
Sim, esses ramos podem e devem se valer de métodos ágeis, no entanto. A aplicação deve se dar em momentos específicos dos projetos que possuam escopo claro de geração rápida de conhecimentos para tomada de decisão, por exemplo: a criação de task forces para reduções de custos ou a solução de um problema técnico relacionado ao design de um produto. Em ambos exemplos o time de projeto deve reagir de forma rápida, porém estruturada. A aplicação da metodologia SCRUM é extremamente vantajosa nestes momentos, pois consegue criar foco em uma entrega específica ou “milestone” através da aplicação dos Sprints, que são ciclos curtos de interação intensa do time de projetos. A demora na solução de uma falha de design de um produto, pode ser fatal para qualquer projeto. Aqui a metodologia ágil é praticamente mandatória.
O nível de maturidade da gestão de projetos na empresa
Tanto a utilização do método PMI, tal como dos métodos ágeis demandam da organização conhecimento e aceitação dos benefícios da gestão de projetos. Organizações que sejam extremamente voltadas para a estrutura funcional (departamentos fortes e pouca integração transversal entre as áreas), tendem a aplicar com pouca frequência a gestão de projetos e por sua vez tratar todos os temas organizacionais através dos seus processos vigentes
Estruturas organizacionais que implementem e utilizem a gestão de projetos, podem ser classificadas como matriciais ou projetizadas. Nas estruturas matriciais a gestão de projetos e a organização funcional convivem e se equilibram. Nas estruturas projetizadas, a organização funcional é mínima e a maior parte dos colaboradores estão alocados em projetos. Em ambos os casos a aplicação do método PMI é positiva, mas principalmente nas estruturas matriciais os principais benefícios deste método são ressaltados, pois existe a clara definição de como as fases de um projeto se integram com as funções departamentais, tornando sua aplicação mais intuitiva para o gerente de projetos e um pouco menos conflituosas para os demais departamentos.
Os métodos ágeis já têm utilização mais frequente em estruturas projetizadas, pois nessas estruturas o entendimento da gestão de projetos é maior e grande parte dos colaboradores está integrada a este modo de trabalho. Um dos grandes desafios do uso dos métodos ágeis é que eles demandam menos estruturação e dispêndio de tempo com a criação de documentos, demandando um trabalho em time mais integrado. Desta forma a resistência à metodologia deve ser baixa, ou então perde-se o propósito do seu uso que é a entrega dos “deliverables” do projeto com maior rapidez. As estruturas projetizadas recebem esta demanda bem, pois não possuem um grande número de departamentos que possam entrar em conflito e demandar um alto nível de controle das tarefas. Já nas estruturas matriciais é mais indicado que o uso dos métodos ágeis seja pontual e para entregas de pacotes de trabalho específicos, justamente pela natural baixa integração dos departamentos o que consequentemente demanda alto nível de controle do time e gestão da informação.
Um fator de sucesso na aplicação de métodos ágeis em estruturas matriciais é o gerente de projetos conseguir fazer a aplicação de Sprints SCRUM, por exemplo, de forma desapercebida pelo time, ou seja, sem que haja pregação sobre a metodologia. Desta forma a resistência dos times funcionais à “novidade” é diminuída. Termos como Workshop ou Taskforce são mais conhecidos e de maior aceitação, porém evocam os conceitos necessários que é foco em uma entrega e trabalho de forma integrada e veloz de um time.
O nível de integração do time e a maturidade dos membros do time
Times integrado produzem melhor. Isto é inquestionável. Times integrados que possuam membros com alto nível de maturidade pessoal e profissional, produzem muito mais. Também inquestionável. Os grandes diferenciais de times com essas características são alta velocidade de interação, baixo nível de conflito e reduzida demanda de controle.
Quando se pretende aplicar métodos ágeis em uma organização, deve –se analisar se os times possuem a adequada integração para tal. Isso se deve ao fato que times pouco maduros demandam um nível de controle e intervenção alto por parte do gerente de projetos. Atas, e-mails, lista de tarefas, gestão de conflitos, escalação hierárquica, dentre outros, são ferramentas de aplicação corriqueira em times com pouca integração e maturidade. Tudo isso vai na contramão da aplicação de métodos que busquem foco na entrega e velocidade.
Antes de aplicar a metodologia de gestão de projetos pretendida, o gerente de projetos precisa mapear o ambiente onde se encontra instalado seu time. Estruturas funcionais que se aproximem de organizações feudais possuem pouca ou nenhuma chance de sucesso na aplicação de métodos ágeis, pois o gerente de projetos terá que atuar como moderador de conflitos constantemente, se afastando do papel básico de um SCRUM Master, por exemplo, que é por essência um facilitador, porém membro executivo do time de projetos.
Em linhas gerais cabe sempre ao gerente de projetos verificar quais são as ferramentas mais adequadas a serem utilizadas em cada projeto sob sua responsabilidade, avaliando sempre o ambiente onde se encontra. O gerente deve sempre se lembrar de que antes de tudo desempenha papel de líder no exercício de seu ofício e como tal, deve saber entender qual é será a receptividade do seu time a uma metodologia a ser empregada. Por fim, vale salientar que o ofício de um gerente de projetos é entregar o escopo que lhe foi delegado e desta forma a aplicação das ferramentas devem estar direcionada para o intuito da entrega do projeto, não sendo necessário que seja feita pregação sobre os benefícios de um dado método ou outro. O método é meio, não é fim.
Rodrigo graduou-se em Engenharia Mecânica pela Unicamp. Também é pós-graduado pela mesma instituição em Gestão Estratégica de Empresas e em Gestão de Projetos pela Universidade Bosch (Alemanha). Atuou por 11 anos no setor automotivo como gerente de projetos e engenheiro chefe, sendo responsável pela introdução de novas plataformas de produto no mercado brasileiro. Desde 2013 atua na JCB do Brasil como gerente de engenharia e PMO.